A 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) deu início no dia 23/11/2022 ao julgamento do Tema 1.125 dos Recursos Repetitivos, que trata da possibilidade de exclusão dos valores relativos ao ICMS-ST da base de cálculo do PIS e da COFINS, especificamente no que toca aos contribuintes substituídos no sistema progressivo de substituição tributária.
É válido relembrar aqui que no sistema de substituição tributária progressivo, o contribuinte geralmente alocado no início da cadeia produtiva (como por exemplo, as indústrias e importadores), fica responsável por recolher todo o imposto que incidiria nas operações subsequentes, com base numa presunção calculada pelos governos estaduais, de modo que não haverá qualquer imposto a ser recolhido diretamente pelos demais envolvidos (distribuidores e varejistas, por exemplo). Logo, aqueles que recolhem todo o ICMS-ST são denominados “substitutos”, enquanto os demais contribuintes da cadeia são denominados “substituídos”[1].
Tendo isso em mente, a controvérsia posta no Tema 1.125 do STJ é no sentido de que o ICMS-ST não deve compor a base de cálculo do PIS e da COFINS dos contribuintes substituídos (normalmente os comerciantes na ponta da cadeia), uma vez que apesar destes não recolherem propriamente o imposto, o valor é embutido no preço das mercadorias adquiridas que serão revendidas, de tal forma que suportam o encargo tributário incidente na cadeia.
Suponha, para ilustrar, um industrial que realize a venda de um produto por R$ 100,00, sendo a alíquota de ICMS 18,00, já embutida no preço, e a alíquota de IPI de 10%. Nesse caso, o preço final do produto será de R$ 110,00, decomposto dessa maneira:
IPI: R$ 10,00
ICMS: R$ 18,00
Preço Líquido: R$ 82,00
Ocorre, entretanto, que o industrial, caso o produto esteja inserido na substituição tributária do ICMS, deve recolher o tributo estadual que incidirá na etapa final da cadeia. Novamente supondo, se a margem de valor agregado for de 70%, o valor do ICMS-ST a ser recolhido pelo industrial será de aproximadamente R$ 15,66, conforme cálculo a seguir:
R$ 110,00 x 1,70 = R$ 187,00
R$ 187,00 x 18% = R$ 33,66
R$ 33,66 (ICMS Total) – R$ 18,00 (ICMS do Industrial) = R$ 15,66 (ICMS-ST)
A discussão, portanto, refere-se exatamente à exclusão desse montante de R$ 15,66 (ICMS-ST) da base de cálculo das contribuições, quando o substituído realize a venda da mercadoria. Como se pode notar, colocando em perspectiva o montante e considerando o faturamento total de vendas de uma empresa, os valores podem atingir quantia relevante e representar uma redução significativa de custo tributário.
A lógica que embasa o pedido de exclusão do ICMS-ST é um desdobramento direto da chamada “tese do século”, julgamento notório do Supremo Tribunal Federal (“STF”) ocorrido em 2017 em que restou decidido que o ICMS não integra a base de cálculo do PIS e da COFINS, eis que o imposto apenas transita de forma temporária pelo caixa dos contribuintes para, posteriormente, ser remetido ao Fisco Estadual, não configurando, assim, uma receita do particular.
Portanto, se o ICMS próprio não pode ser considerado uma receita, conforme entendimento do STF, tampouco pode o ICMS-ST, dado que a substituição tributária não cria um novo tipo de ICMS, sendo apenas uma técnica de arrecadação criada para facilitar a fiscalização, conforme entendimento já consolidado do próprio STJ em diversos julgados. Inclusive, em recente decisão proferida no REsp nº 1.454.184/MG, foi o posicionamento da Corte Superior:
5. O ICMS/ST não é um tributo diferente do ICMS próprio. A base de cálculo do ICMS não sofre modificação quando se trata de arrecadação mediante substituição tributária, como ocorre na hipótese em exame. E nem poderia ser diferente, uma vez que, como a própria nomenclatura informa, a substituição tributária trata-se de uma técnica de arrecadação e fiscalização fazendária […].
6. O ICMS e o ICSM/ST são o mesmo tributo, portanto, não há como julgá-los e entende-los de maneira diversa, pois trata-se apenas de aplicar um regime diferenciado para simplificar a tributação e fiscalização.
Por fim, os indícios apresentados até então são no sentido de que o STJ seguirá a linha de entendimento supracitada, haja vista que o Relator do caso, Ministro Gurgel de Faria, já proferiu voto em sentido favorável aos contribuintes, defendendo a exclusão do ICMS-ST da base de cálculo das contribuições ao PIS/COFINS. Atualmente o julgamento encontra-se suspenso, sem previsão de inclusão em nova pauta de julgamento, face o pedido de vista da Ministra Assusete Magalhães.
Oportuno destacar que o entendimento a ser adotado no Tema 1.125 vinculará todos os tribunais do país, cabendo ao STJ a palavra final sobre o assunto, já que o próprio STF já se manifestou no sentido de que a discussão em tela é de natureza infraconstitucional, não cabendo à Suprema Corte analisá-la[2]. Ademais, há a possibilidade de os ministros modularem os efeitos do julgamento, conforme previsão do art. 927, § 3º do CPC, vedando a aplicação retrospectiva do entendimento, considerando que até então, a 2ª Turma do STJ possui entendimento contrário à tese dos contribuintes, não havendo posicionamento consolidado da 1ª Turma.
Assim, a recuperação dos valores recolhidos indevidamente nos últimos 5 anos pelos contribuintes exigirá medida judicial própria, a ser ajuizada até a data da conclusão do julgamento, caso a Corte siga a tradição de adotar como marco inicial da modulação a publicação da ata de julgamento.
Trata-se de mais uma oportunidade de redução da carga tributária, ainda que por meio judicial, cabendo aos contribuintes analisarem a pertinência de discutirem o tema evitando que a modulação de efeitos impeça de recuperaram o montante indevidamente recolhido nos últimos 05 anos.
Forte abraço!
Professor Fabio Silva
Kauê Guimarães
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[1] Especificamente no caso do ICMS normalmente o substituto é o industrial ou importador e o substituído o comerciante no final da cadeia
[2] Decisão proferida no Recurso Extraordinário nº 1.258.842/RS, em 25/06/2020, em que o Plenário da Corte entendeu pela ausência de repercussão geral da matéria, propondo a fixação da seguinte tese: “É infraconstitucional, a ela se aplicando os efeitos da ausência de repercussão geral, a controvérsia relativa à inclusão do montante correspondente ao Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) destacado nas notas fiscais ou recolhido antecipadamente pelo substituto em regime de substituição tributária progressiva na base de cálculo da contribuição ao Programa de Integração Social (PIS) e da Contribuição para Financiamento da Seguridade Social (COFINS)”.