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O ICMS nas Transferências Interestaduais entre Estabelecimentos do mesmo Titular

Em sessão plenária do dia 19/04/2023, os Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) concluíram o julgamento dos embargos de declaração na Ação Direta de Constitucionalidade (ADC) 49, que versavam sobre a possível modulação dos efeitos da decisão que declarou inconstitucional a incidência de ICMS sobre as operações interestaduais entre estabelecimentos do mesmo titular.

A decisão de mérito objeto da modulação em questão data de meados de abril de 2021, quando a Corte reputou como inconstitucionais determinados artigos e trechos da Lei Complementar Federal nº 87/1996 (Lei Kandir), sob o fundamento de que a mera circulação física de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo contribuinte não atrai a incidência do ICMS, ainda que em operações interestaduais, dado que a configuração do fato gerador do ICMS exige a circulação jurídica da mercadoria, ou seja, a remessa com a efetiva transferência de titularidade. Nas palavras do Relator, Ministro Edson Fachin, “a tributação por meio de ICMS demanda a existência de um negócio jurídico oneroso que envolve a transferência da titularidade de uma mercadoria de um alienante a um adquirente”.

O mesmo raciocínio deve ser aplicado também para remessas de mercadorias à armazéns gerais e depósitos fechados, haja vista que nestes casos não que se falar em circulação jurídica da mercadoria, mas tão somente a sua circulação física, sem qualquer atividade de mercancia.

Em que pese o STF e o STJ (Superior Tribunal de Justiça) já terem se manifestado inúmeras vezes no passado quanto a impossibilidade de cobrança do ICMS em operações entre estabelecimentos do mesmo contribuintes, inclusive em julgamentos afetados pelo rito dos recursos repetitivos, fato é que tais decisões não afastavam as disposições em sentido contrário contidas na Lei Kandir, vinculando tão somente o próprio Poder Judiciário.

Dessa forma, a decisão proferida agora em controle concentrado de constitucionalidade teria o condão de afastar as normas inconstitucionais do plano de validade do ordenamento jurídico, podendo as mesmas serem declaradas nulas ab initio, ou seja, com efeitos retroativos (efeito ex tunc).

Contudo, o julgamento dos embargos de declaração da ADC 49 se voltou justamente a modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade, hipótese em que o STF avaliou os impactos econômicos, financeiros e sociais decorrentes da tal declaração. Assim, os embargos de declaração foram julgados procedentes para modular os efeitos da decisão de mérito, atribuindo-lhe eficácia pró-futuro a partir do exercício financeiro de 2024, ressalvados os processos administrativos e judiciais que se encontravam pendentes de julgamento até a data da publicação da ata de julgamento da decisão de mérito (29/04/2021).

Em outras palavras, os estados podem continuar cobrando o ICMS sobre operações interestaduais realizadas entre estabelecimentos do mesmo contribuinte até o final de 2023, ressalvados os contribuintes que detenham discussões judiciais ou administrativas contestando a exigência do imposto sobre referidas operações.

No entanto, um ponto fundamental ainda resta pendente de resolução: os créditos adquiridos pelos contribuintes decorrentes das operações de aquisição de mercadorias. Na sistemática atual, o contribuinte ao comprar uma mercadoria, adquire créditos de ICMS por força da não-cumulatividade do imposto. Posteriormente, quando remete a mesma mercadoria pra sua filial em outro estado, o estabelecimento de origem recolhe o ICMS corresponde, abatendo-lhe do respectivo crédito, enquanto que o estabelecimento destinatário se credita quando da entrada da mercadoria. Para melhor elucidação, vejamos a ilustração abaixo de cenário hipotético:

 

 

Assim, percebe-se que há a compensação do crédito adquirido pelo Varejista em São Paulo com o débito devido quando da remessa da televisão à filial em Belo Horizonte. Entretanto, com a nova sistemática originada pela decisão do STF, há uma mudança considerável no quadro. Vejamos:

 

 

Portanto, percebe-se que com a não tributação via ICMS das operações interestaduais entre estabelecimentos do mesmo contribuinte, ocorrerá um possível acúmulo de créditos do imposto pelos remetentes, já que não haverá débito a ser compensado. Consequentemente, é fundamental que sejam estabelecidos critérios para a utilização desse crédito, caso contrário, conforme consta das figuras, haverá um aumento da carga tributária total (de R$ 540,00 para R$ 660,00, justamente em razão do crédito de R$ 120,00 acumulado pela distribuidora paulista).

Tendo isso em mente, a Suprema Corte ao julgar os citados aclaratórios, determinou que os Estados deverão disciplinar, até o início de 2024, a transferência de créditos de ICMS entre estabelecimentos do mesmo titular. Caso assim não o façam dentro do referido prazo, o direito à transferência dos créditos será livre aos contribuintes. Assim, devemos aguardar a publicação de ato legal do CONFAZ (Conselho Nacional de Política Fazendária) que discipline o regramento a ser aplicado para a transferência de créditos nas operações interestaduais envolvendo estabelecimentos do mesmo titular.

Por fim, válido ressaltar que não houve a publicação do acórdão até o presente momento, de modo que uma análise mais exauriente do tema dependerá da disponibilização da integralidade da decisão do STF.

 

Forte abraço!

 

Professor Fabio Silva

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Kauê Guimarães

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