Como sabemos o IPI é um imposto federal não cumulativo que incide sobre operações com produtos industrializados. Dessa forma, uma pessoa jurídica que seja considerada industrial, ainda que por equiparação, está sujeita ao pagamento desse tributo quando realizar operações com produtos industrializados.
Nos últimos anos surgiu uma polêmica a respeito do pagamento do IPI nas operações de revenda de produtos industrializados importados. Não há quaisquer dúvidas sobre a incidência do IPI na realização de importação. O tributo acaba por incidir em razão da aplicação do princípio do destino, que estabelece que o produto importado deve receber o mesmo tratamento tributário do produto nacional, de forma a não criar disparidades fiscais em razão da origem do produto.
Singelamente esclarecendo, tomemos como exemplo um fabricante estabelecido no Brasil que realize a operação de venda de uma geladeira em território nacional, com incidência de IPI de 15%. A lógico do princípio do destino é que se uma empresa, ao invés de fabricar o produto no Brasil, entenda por bem importar uma geladeira e revender em território nacional, deverá arcar com a mesma carga tributária, no caso, uma alíquota de IPI de 15% incidente sobre a importação.
Pouco há a ser questionado a respeito dessa lógica que tem por objetivo garantir neutralidade tributária, ou seja, o empresário pode decidir importar ao invés de fabricar, porém, caso assim decidir, não será em razão da carga tributária, haja vista o tratamento similar que recebem os produtos nacionais e importados. Notem, evidentemente, que aqui estou discutindo apenas o IPI, sem levar em consideração, por exemplo, o imposto de importação, que favorece o produto nacional.
Contudo, a polêmica que surgiu a respeito desse cenário não se refere à incidência do IPI no momento da importação, mas sim sobre a cobrança desse imposto no momento da revenda, naquelas ocasiões em que o importador não realiza qualquer processo industrial na operação. Imagine-se, por exemplo, que empresa A realizou a importação de uma geladeira. Por conta do ato, incidiu 15% de IPI. Posteriormente, sem que realizasse qualquer operação de industrialização, revendeu no Brasil o mesmo produto, por valor superior, novamente incidindo IPI.
É essa segunda operação objeto de controvérsia, tendo em vista que os contribuintes entendem que, por não haver qualquer operação de industrialização, não deveria haver incidência do IPI. Em outras palavras, a incidência do IPI, nessa hipótese, deveria ficar restrita ao momento da importação, com a desoneração na etapa subsequente da revenda.
O STF, contudo, tratou de resolver qualquer dúvida ao julgar o Tema 906 da repercussão geral, concluindo: “É constitucional a incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI no desembaraço aduaneiro de bem industrializado e na saída do estabelecimento importador para comercialização no mercado interno”
No acórdão prolatado pela Suprema Corte (disponível clicando aqui!) o ministro Relator, Marco Aurélio Melo, assim definiu a controvérsia em julgamento:
“Está em jogo definir a constitucionalidade da incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI quando da revenda, no mercado interno, de bens importados e não submetidos a novo beneficiamento industrial no período entre importação e revenda, à luz da materialidade constitucional do tributo e do princípio da isonomia tributária.”
O resultado não foi unânime. Favorável ao contribuinte, podemos citar o voto do Ministro Relator, que assim se manifestou:
“Conforme consignei, a materialidade do IPI envolve a tributação da operação com produtos industrializados na etapa subsequente ao ato de industrializar. Nesse sentido, justifica-se a incidência no desembaraço, uma vez que o importador faz as vezes de industrial ao internalizar um produto estrangeiro na cadeia econômica nacional. É a etapa seguinte à industrialização no exterior, tendo-se a lógica apontada por Misabel Derzi, nas notas ao livro Direito Tributário Brasileiro, de Aliomar Baleeiro, de permitir ao produto estrangeiro ser “nacionalizado”.”
“Uma vez internalizado, nacionalizado, inexiste razão constitucional para nova incidência se não realizado, pelo importador, já então com o produto no estabelecimento, após satisfazer o imposto no despacho aduaneiro, qualquer um dos processos de industrialização previstos no parágrafo único do artigo 46 do Código Tributário Nacional”
Por sua vez, o Ministro Alexandre de Moraes, analisando o aspecto relacionado à isonomia entre o revendedor e o industrial, adotou linha diversa, entendendo que limitar a incidência do IPI apenas ao momento da importação cria situação dispare favorável ao importador e em detrimento do industrial, conforme notamos em suas palavras:
“Ora, o importador que somente recolhe o IPI por ocasião de desembaraço aduaneiro não está na mesma situação do industrial brasileiro. A base de cálculo do IPI cobrado deste último alcança, além dos custos de produção e todos os impostos aí incidentes, o lucro da indústria. “
“Assim, se o importador agrega valor ao produto (nem que seja apenas o seu lucro), cobrando valor superior, na revenda do bem no mercado nacional, do que aquele montante pago na importação, deve pagar o tributo sobre este acréscimo, tal qual ocorreria, com qualquer outro industrial ou equiparado a industrial na alienação de produtos nacionais.”
A tese do Ministro Alexandre de Moraes prevaleceu entre a maioria dos Ministros e ele tornou-se relator designado, sendo definido, portanto, que o IPI incide na operação de revenda de produto importado, ainda que inexistente qualquer operação industrial nessa etapa, em razão da equiparação legal que, segundo o Tribunal, está alinhada com a Constituição Federal e o princípio da isonomia.
Dessa forma, muito embora os argumentos dos contribuintes sejam bastantes convincentes, atualmente, não há mais controvérsias jurídicas sobre o tema, prevalecendo a tese pró-fisco e incidindo o IPI na operação de revenda.
Forte abraço!
Professor Fabio Silva